Em Olhão não se ferve em cultura e, embora haja um apontamento aqui e ali, o foco das atenções são as feiras agrícolas e os festivais de marisco. Enfim!
Já que o Auditório parece que também fechou para férias, faço eu aqui um momento de poesia, imaginando estar num lugar calmo sob as estrelas, com um ventinho calorento e uma bebida fresca.

Faço sempre quinze anos nesta noite de Agosto,
e a noite fica olhando para mim:
é uma cabeça de mulher sem princípio nem fim,
e esconde o corpo e avança o rosto.
Na boca, florindo um riso malicioso de intriga,
há o adeus estouvado de uma rapariga
feita para eu amar e que vai casar esta noite.
Fecho os olhos e deixo entornar os sentidos
até endoidecer,
para vingar-me desse riso de mulher
e arpoá-la com os meus braços e rasgar-lhe os vestidos
e apunhalá-la no sexo até ouvir-lhe os gemidos.
Mas junto a mim a noite é apenas o rosto
de uma cabeça de mulher sem princípio nem fim.
E a noite fica olhando sempre para mim...
e eu tenho sempre quinze anos nesta noite de Agosto!
Leonel Neves
Natural do Algarve (1986)
Imagem: quadro de Tamara de Lempicka
3 comentários:
Caro Mano João,
Não lhe conhecia esta sensibilidade e fico agradado por isso e pelo pedacinho que nos deixa, e com vontade de querer ler mais, dum autor que não conheço.
É a poesia - para além das preocupações civicas, a juntar-nos também.
O resto são as romarias e os entretenimentos a que o Verão convida, mas que alguns (com responsabilidades) levam ao exagero, para que não se pense muito, ou mesmo nada, nos problemas que existem e nos que nos vão criando.
Para esse entretenimento e essas festas, parece não faltar dinheiro em Olhão...
Mas voltando ao "seu" poema, gosto especilamente deste trecho:
"...fecho os olhos e deixo entornar os sentidos..."
Digo eu:
"Fica-se bem... assim..."
Abraço
José Castanheira
Pois é Amigo Castanheira, a poesia é o meu "fraquinho"! Não a faço, mas gosto de lê-la. E estes dias de Agosto convidam a leituras que nos ponham a cabeça em ordem face ao que vai pelo nosso país e pela nossa cidade em particular.
Obrigado pela visita e pelo comentário.
Haja saúde
Mano João
Poema bem bonito, Mano João!
Fico à espera de mais. Curioso é que o autor tenha nascido no mesmo ano que eu...
Um abraço!!
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